SEXISMO NAS IGREJAS – QUE TIPO DE HOMEM É VOCÊ?

Pela Pra. Isabela Calil

Em 2019 fui a um Congresso Batista no Rio de Janeiro. Tomei meu lugar e esperei o início
dos trabalhos. As boas-vindas foram dadas por um rapaz branco de mais ou menos 25
anos. Em seguida, um outro jovem, desta vez preto, trouxe uma linda palavra devocional.
Imediatamente após, o Ministério de Louvor, composto por seis rapazes, começou a cantar.
Depois disso, o dirigente da programação pegou o microfone e apresentou o pregador da
noite. Ao final, após o apelo, o Pastor da Igreja orou pelos convertidos.
Nenhuma mulher subiu naquela plataforma, ocupou aquele púlpito ou tocou naquele
microfone. Nem uma sequer! Nós éramos a maioria nos bancos e isso me chamou muito a
atenção. Eu sei que é uma experiência pessoal, e não quer dizer absolutamente nada. Mas
pensei muito sobre ela e, por isso, proponho que você considere suas experiências
também.
Pense rápido comigo na Comunidade de Fé da qual você faz parte. Imagine a congregação
pós-pandemia lotada em um domingo à noite. Você contaria mais mulheres ou mais
homens? Provavelmente, mais mulheres. Ok. Agora, siga daí:
Quantas mulheres você conhece que pastoreiam uma grande Igreja Batista? Quantas
participaram do último processo de sucessão pastoral da sua comunidade? Calma, eu sei,
peguei você de surpresa. Vamos mais devagar:
Você consegue dizer o nome de 10 Pastoras Batistas que você conhece? Tá bom, 5 que já
pregaram na sua Igreja já me servem. Ok, pense em 3 Pastoras, batistas ou não, que você
só ouviu falar, pra gente poder continuar.
Nossas experiências pessoais ainda não bastam. Ainda são insuficientes. Mas existe uma
pesquisa do DATAFOLHA (1) , realizada em janeiro de 2020, que mostra que 58% da
comunidade evangélica é composta por mulheres.
Nossa presença é perceptível no dia a dia da comunidade. Nós, mulheres, estamos lá, na
base das congregações, fazendo missões, no suporte aos eventos, na ação social, na
educação infantil, na música e na intercessão.
Mulheres que com esforço, dedicação e comprometimento servem e sustentam nossas
igrejas. Dos trabalhos espirituais aos trabalhos braçais, você sempre nos encontrará, Marias
e Martas, servindo o Mestre.
Entretanto, também é notório que poucas de nós chegamos aos púlpitos e à liderança em
geral. Nós servimos para servir, mas não servimos para liderar. Já é um fato conhecido e
reconhecido que os lugares de autoridade e as posições de poder não são para nós.
A questão da liderança feminina nas Igrejas Batistas tem sido muito discutida nos últimos
anos. Tanto é que até a OPBB foi obrigada a nos “dar” espaço. E, nas minhas relações
pessoais, tenho muito mais colegas de Ministério que se alegram ao encontrarem uma
Pastora, do que colegas que ainda resistem à “aceitação” de mulheres no Ministério
Pastoral.
Todavia, nossa dificuldade em chegar aos microfones das Igrejas, ou à frente dos
ministérios, é a consequência, e não a causa. (E a causa está além das paredes dos templos
e dos limites da igreja.) Nossas necessidades, nossos desejos, nossas particularidades,
nossas ideias, nossas vocações, nossos corpos, nossas vozes são silenciadas das classes aos
cultos, do meio da congregação aos púlpitos.
O lugar que deveria nos deixar à vontade, seguras e livres, muitas vezes, é o lugar onde
nossos sofrimentos começam ou pioram. Medo, culpa e vergonha nos são impostos de
forma covarde com o uso de armas contra as quais – no espaço religioso – a maioria de
nós não tem a menor condição de se defender: as Sagradas Escrituras e a autoridade
espiritual.
Veja bem, a cada minuto, no Brasil, 25 mulheres sofrem violência doméstica (2) e 10 delas são
evangélicas (3). Essas 10 mulheres não sofrem silenciosamente porque querem, elas ouvem,
domingo após domingo, de seus líderes espirituais que “o que Deus uniu, homem algum
pode separar”; e aí ficam com medo de falar sobre suas dores. Leem textos,
(intencionalmente) apresentados fora de contexto, dizendo que o homem, que a agride
diariamente, é o cabeça de sua vida e ela deve submissão a ele; daí temem se rebelar
contra uma ordenança divina. Sem contar a lembrança diária de que é a mulher que atrai o
homem para o pecado; e é por isso que ele acaba tomando péssimas decisões.
Toda mulher é uma Eva (ou uma Lilith). Diante disso, com quem ela compartilharia seus
sofrimentos? Pra que abrir a boca quando já lhe foi dada a resposta? Obedeça, cale-se,
encolha-se, submeta-se, conforme-se.
A maneira como a Igreja interpreta o texto bíblico é machista. O discurso de nossos
púlpitos é sexista. E a “espiritualidade” dos Homens de Deus em nossas congregações é
patriarcal. O local que deveria ser de acolhimento para a que sofre, de cura para a que é
machucada e de justiça para a oprimida, invariavelmente, é o lugar que empodera as
violências contra a mulher.
Veja bem, “permitir” que mulheres almejem ao episcopado, não é um grande avanço para
a Igreja Batista no Brasil. Incluir uma ou outra mulher nos grandes cargos denominacionais
só para justificar acesso e diversidade, não resolve nada. Nossa escassa presença nos
grupos pastorais não demonstra que estamos chegando lá, mas denuncia que vocês,
queridos irmãos, ainda estão falhando demais na base que constrói essa pirâmide!
Essas decisões ficam muito bonitas na foto, mas não fazem diferença alguma, se a
realidade diária de nossas irmãs continua sendo a de opressão, silenciamento e submissão.
Irmãs que, majoritariamente, se assentam para cultuar e se levantam para servir em nossas
congregações e missões. O problema de nossas comunidades não é ter ou não ter
Pastoras, mas ser ou não machista, sexista e patriarcal.
Dos diversos pecados que existem dentro da Igreja, esse é um que tem estado cada vez
mais latente. Não há como se libertar disso sem que você, homem batista, pare de se
enxergar superior às suas irmãs e as enxergue como iguais a você. É impossível enterrar
esse pecado sem que vocês decidam, verdadeiramente, imitar o homem Jesus:
Que fica ao lado da mulher acusada de adultério prestes a ser apedrejada pelos machistas
de seu tempo. Que entende que as irmãs, suas amigas, têm a liberdade de, assim como os
homens, escolherem assentar-se a seus pés como qualquer outro discípulo. E que,
derrotado pelos argumentos de uma mulher siro-fenícia, faz o que ela quer.
Existem pelo menos três tipos de homens nas igrejas: os que nos silenciam quando
tentamos falar, os que se silenciam quando falamos e os que juntam suas vozes com as
nossas da congregação ao púlpito. Qual deles é você?

PS | Se você é Pastor, Diácono ou líder e está lendo tudo isso, e pensando que na sua igreja
as coisas são diferentes, só porque nenhuma mulher falou sobre isso com você, sinto lhe
informar que a questão é que você nunca se mostrou um aliado, alguém confiável, alguém
que inspira segurança, às mulheres da sua igreja.

(1) https://www1.folha.uol.com.br/poder/2020/01/cara-tipica-do-evangelico-brasileiro-e-feminina-e-negraaponta-datafolha.html

(2) https://piaui.folha.uol.com.br/cada-minuto-25-brasileiras-sofrem-violencia-domestica/

(3) VILHENA, Valéria Cristina. Pela Voz das Mulheres: uma análise da violência doméstica entre mulheres
evangélicas atendidas no Núcleo de Defesa e Convivência da Mulher – Casa Sofia.São Bernardo do
Campo, 2009. Universidade Metodista de São Paulo.