CARTA ABERTA AOS BATISTAS BRASILEIROS

CARTA ABERTA AOS BATISTAS BRASILEIROS

Pelo livre exame das Escrituras

Nós, do Movimento Batistas por Princípios, nos dirigimos a todos os batistas que fazem de suas igrejas locais o espaço para a celebração e comunhão fraterna a partir daquilo que conhecemos como tradição batista.

A nossa motivação com essa carta aberta aos batistas brasileiros: pelo livre exame das Escrituras se dá a partir de fatos que estamos vivenciando no âmbito denominacional, quais sejam: as nossas instituições paraeclesiásticas, Convenção Batista Brasileira e Ordem dos Pastores Batistas do Brasil, e suas respectivas seções estaduais, estão, de maneira sistemática e, por vezes, hierarquicamente, impetrando um modus operandi que nos causa, no mínimo, estranheza. Nos referimos à maneira como nossas instituições vêm conduzindo um processo de tentar usurpar a liberdade da igreja local em ler, interpretar e ensinar as Escrituras livremente, sem quaisquer interditos.

Como sabemos, os Batistas surgem a partir de quatro liberdades centrais e inegociáveis, ainda que sejam frágeis: a liberdade diante da Bíblia, radicalizando uma das máximas da Reforma protestante – o livre exame das Escrituras; a liberdade individual, colocando no indivíduo as qualificações inerentes à sua consciência; a liberdade da igreja local, a partir da sua autonomia a comunidade tem condições sine qua non para dirigir suas questões espirituais; a liberdade religiosa, reivindicando a escolha que cada indivíduo pode fazer em relação à sua crença. Essas liberdades são patrimônio dos Batistas ao longo da sua trajetória na história do cristianismo.

Assim, estamos acompanhando com perplexidade certas atitudes que nossas instituições estão tomando para tutelar a liberdade da igreja local quanto ao livre exame e interpretação das Escrituras. Ao que parece, as nossas instituições, CBB e OPBB, estão reivindicando para si um certo magistério teológico quando procuram utilizar nossos documentos oficiais (estatutos, código de ética, declaração doutrinária) com o propósito de suplantar a autonomia teológica da igreja, comprometendo, por sua vez, a coerência e intenção desses documentos. E, o que é igualmente grave, isso se dá de maneira seletiva, impondo rigores desiguais para algumas igrejas e pastores, a fim de demonstrar um certo controle institucional, principalmente quando o assunto ganha repercussão.

Ainda que já saibamos, convém lembrar que nossas instituições não têm qualquer competência bíblico-teológica para ingerir na igreja local suas determinações, salvo quando esta solicita tal acompanhamento, conselho e direcionamento baseado na experiência das nossas instituições. Desse modo, lembramos que no Estatuto da CBB (Art. 2º, § 3º) há uma cláusula pétrea: “A Convenção reconhece como princípio doutrinário a autonomia das Igrejas filiadas, sendo recomendações que lhes são feitas decorrentes do compromisso de mútua cooperação por elas assumido”. A partir desse parágrafo, a CBB faz recomendações às igrejas filiadas e não lhe é facultada a ingerência nas igrejas. Do mesmo modo, a OPBB tem como principal finalidade entre os pastores “promover a convivência, fraternidade e solidariedade entre os filiados”.

Quando nossas instituições arrogam para si uma espécie de magistério teológico, no sentido de se entenderem como “guardiãs da doutrina”, assumem uma função que não lhes compete. Em artigo no O Jornal Batista (21/11/21) intitulado “A importância da educação teológica e ministerial”, o autor, atual presidente da ABIBET, diz textualmente que as igrejas esperam que as instituições teológicas funcionem como um fórum definidor da doutrina e que as próprias igrejas as têm como “guardadoras da sã doutrina”. Preocupante.

A Declaração Doutrinária da CBB não é normativa, antes indicativa quanto ao modo que as igrejas Batistas se entendem doutrinariamente. Isso significa que quando uma Igreja Batista assume estatutariamente a Declaração Doutrinária da CBB, a igreja tem na Declaração o parâmetro para ela, a igreja local, conduzir suas questões bíblico-teológicas, não a CBB ou a OPBB e suas seções.

Com isso, entendemos que, antes de qualquer medida que tenha como objetivo impor uma interpretação doutrinária para uma igreja (CBB) ou para um pastor (OPBB), cabe à igreja local essa função e não às nossas instituições. Não por acaso que John Landers, professor no Seminário Teológico Batista do Sul do Brasil, ensinou: “Em caso de diferença de interpretação bíblica, cada igreja batista tem que ler e interpretar a Bíblia para si mesma. De acordo com este princípio, cada igreja define sua própria maneira de proceder em questões duvidosas”. E antes dele, A. B. Langston já alertava em 1933: “A Convenção Batista Brasileira não é uma super-Igreja ou espécie de Igreja-mãe, mas simplesmente uma organização auxiliadora das Igrejas locaes” (sic).

Com essa carta aberta, reafirmamos a competência das nossas igrejas no livre exame e interpretação das Escrituras tendo como base a pessoa de Jesus Cristo, a tradição batista e a Declaração Doutrinária da CBB. E assim, esperamos que as nossas instituições, quando houver situações a serem tratadas com igrejas (CBB) e pastores (OPBB), respeitem as devidas competências. Assim, visando a fraternidade denominacional e, acima de tudo, a vivência em amor (Cl 3,14), esperamos que o trato seja respeitoso, valorizando o cuidado mútuo, mantendo uma relação humanizada quando envolvendo a igreja local e o pastor.

Movimento Batistas por Princípios